16/04/2011
07h00 - Atualizado em 16/04/2011 07h00
Exército registra em 2010 recorde de pedidos de desligamento em 10 anos
Militares
apontam baixo salário como motivo para demissões
voluntárias.
Diminuiu ainda procura nos concursos, em especial da
Escola de Sargentos.
Tahiane
Stochero
Do
G1, em São Paulo
Um
levantamento realizado pelo Exército a pedido do G1 aponta
que 2010 foi o ano com maior número de pedidos de desligamento de
oficiais e sargentos do Exército em dez anos. Foram 105 pedidos de
demissão no ano passado, em 2009 foram 88. Para se ter uma ideia, em
2000, apenas 44 militares de carreira pediram para ir para a reserva.
Os
dados apontam, ainda, queda no número de inscritos em algumas
escolas militares desde 2000. A variação na relação
candidato/vaga é mais visível na Escola de Sargento das Armas
(EsSA), que em 2000 tinha 97.685 inscritos para 1.500 vagas (65
candidatos/vaga), e no ano passado apresentou 42.850 candidatos para
o concurso de 1.178 vagas (média de 36 candidatos/vaga).
Em
nota, o Centro Comunicação Social do Exército disse que “o
número de inscritos para o exame de seleção da Escola de Sargentos
das Armas (EsSA) vem se mantendo dentro de uma média de,
aproximadamente, 40.000 candidatos/ano”, mas que “observa-se uma
redução ao longo dos últimos anos” devido a três fatores: a
exigência, a partir de 2006, de que os candidatos tenham ensino
médio completo, “o considerável crescimento do número de
vestibulares no país” e “o elevado número de concursos públicos
realizados nos últimos anos no Brasil”.
Demais
unidades de ensino especializadas, como o Instituto Militar de
Engenharia (IME), a Escola Preparatória de Cadetes do Exército
(EsPCEx), que prepara os futuros oficiais, e a Escola de Formação
Complementar do Exército (EsFCEx), que seleciona e prepara
profissionais já com curso superior, também apresentaram variação
na procura durante a década, mas o número de inscritos voltou a
subir em 2010, segundo o Exército.
“Eu
amava o Exército, gostava de ser militar, mas infelizmente a
remuneração não compensa. Desde que dei baixa, fiz concurso
público e agora sou técnico judiciário em Jaraguá do Sul, em
Santa Catarina”, disse ao G1 Heron
Dias, de 32 anos. Ele era 2º sargento quando pediu desligamento em
2002. O salário dessa função atualmente é de R$ 2.748, segundo
dados do Ministério da Defesa.
“Hoje,
eu ganho o equivalente ao salário de um capitão”, afirmou Dias,
cuja remuneração atual supera os R$ 5.340, que é o soldo de um
capitão.
“Ser
militar era um sonho de infância, e servi durante cinco anos no Rio
de Janeiro, na Escola de Material Bélico e no Batalhão Logístico.
Morava em frente ao Morro da Mangueira e vivenciava diariamente
tiroteios. Vivia assustado, temendo, por ser militar, que me matassem
quando fosse assaltado”, relembrou ele.
Já
o sargento Glauber Rafael Vargas, de 29 anos, pediu demissão do
Exército após nove anos de carreira, por outro motivo. Após atuar
como militar no Rio de Janeiro, Amazonas e Acre, ele prestou
concurso público e agora é agente da Polícia Rodoviária Federal
em Mato Grosso. “No meio militar, a hierarquia e a disciplina,
muitas vezes, se confudem com falta de respeito. Me estressava um
bocado, era humilhado, trabalhava sempre sobre pressão, correndo
risco de punição. Agora, me considero profissionalmente realizado”,
afirmou.
Para
o tenente Luiz Eugênio Bezerra Mergulhão Filho, presidente da
Associação dos Oficiais da Reserva e Reformados das Forças
Armadas, a remuneração é o principal fator que leva à debandada
dos militares. “O mercado civil sempre pagou melhor que o militar.
Ainda mais com os cortes no orçamento das Forças Armadas”, disse.
Segundo
Mergulhão Filho, a decisão do desligamento “varia de pessoa para
pessoa”. “A decisão entre quem sai e quem fica está no gostar
do que faz. O militar que gosta nunca pensou em salário”, afirmou.
Já
para o doutor em relações internacionais e especialista militar
Gunther Rudzit, a economia é o principal fator para a mudança na
procura da carreira militar. “Com o mercado aquecido, fica difícil
reter nas Forças Armadas o profissional especializado. Acho que é
só isso, não acredito que esteja havendo uma mudança na percepção
da sociedade sobre as Forças Armadas", afirmou.
Para
o escritor Leonardo Trevisan, especialista na área, um dos fatores
que provocam as demissões é que, “enquanto o oficial vislumbra
uma carreira em que vai ganhar mais, o sargento não vê isso”. Ele
afirmou que, pelas pesquisas de aptidão entre jovens, não percebe
“alterações no apelo pela carreira militar”. “Ela é uma
carreira que independe da economia, pois muitas vezes está ligada à
vocação. Tanto que as Forças Armadas não precisam fazer anúncio
na TV convocando os jovens para se alistar anualmente. A cada dois
anos é suficiente”, disse.
Em
nota, o Exército afirmou que o número de desligamentos da tropa no
ano passado é “mínimo”, representando aproximadamente 0,42% do
total de oficiais, hoje em 25 mil, segundo a corporação. “A Força
entende que os números envolvidos na questão estão dentro dos
padrões e coerentes com a série histórica no âmbito do Exército”,
segundo o texto.
Ano | Desligamentos* |
---|---|
2000 | 44 |
2001 | 30 |
2002 | 38 |
2003 | 59 |
2004 | 53 |
2005 | 53 |
2006 | 96 |
2007 | 68 |
2008 | 100 |
2009 | 88 |
2010 | 105 |
Fonte: Exército
* Desligamentos de oficiais a pedido |
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