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domingo, 20 de novembro de 2011

PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

O princípio da presunção de inocência


Senhores, para quem está sub judice, é necessário estudar com mais atenção o princípio da "não-culpabilidade". O fato de existir jurisprudência nos tribunais de primeira instância refutando a alegação da "presunção de inocência" nos casos em que militares são impedidos de exercerem alguns direitos inerentes à carreira, não encerra o assunto por completo. O STF ultimamente já deu mostras abundantes de que a palavra de ordem atualmente é o respeito incodicional ao princípio da "não-culpabilidade". É só ver as notícias sobre o assunto que estão por aí, a rodo. Lembrem-se de que o Direito não socorre aos que dormem (dormientibus non succurrit jus)






Vejamos, a propósito, um texto da lavra de Simone Schireiber:


Dispõe o inciso LVII do art. 5º da Constituição Federal de 1988: "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". O presente estudo objetiva, em primeiro lugar, fixar o significado de tal enunciado normativo e, em segundo lugar, examinar como se dá sua aplicação na prática judiciária brasileira.

Trata-se do princípio da presunção da inocência, agora positivado, muito embora já fosse arrolado pela doutrina pátria dentre os princípios gerais que regiam o direito processual penal [01]. A forma como está enunciado na constituição, entretanto, ensejou por si mesma alguns debates a respeito do seu alcance. Isso porque não se repetiu a fórmula consagrada na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, aprovada pela Assembléia Nacional Francesa, em 26 de agosto de 1789, bem como pela Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, pelo Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1966 e pela Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969.


Não está dito no texto constitucional que todo o homem se presumirá inocente, até que seja condenado, mas sim que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Em vista disso, não se estaria consagrando propriamente o princípio da presunção da inocência, mas sim o da desconsideração prévia da culpabilidade, de aplicação mais restrita.

De fato, a Constituição Federal Brasileira adotou a redação do art. 27.2 da constituição italiana de 1948, a qual por sua vez resultou de um movimento protagonizado por parte da doutrina italiana que defendia a restrição do alcance do princípio da inocência, com vistas a garantir a eficácia do processo penal [02]. Enrico Ferri sustentava que só se poderia admitir a presunção de inocência do delinqüente ocasional que houvesse negado a prática do crime, e mesmo assim somente enquanto não se reunisse prova indiciária contra ele. A própria instauração do processo criminal autorizaria que se presumisse a culpa do imputado, e não sua inocência [03].

Vicenzo Manzini refuta com veemência o princípio, qualificando-o como absurdo, "una extravagancia derivada de los viejos conceptos, nacidos de los princípios de la Revolución francesa, por los que se llevan a los más exagerados e incoherentes excesos las garantias individuales" [04]. Para Manzini, considerando que as presunções são meios de prova indireta através dos quais se chega a determinado convencimento, absoluto ou relativo, com base na experiência comum, é impróprio falar em presunção de inocência. Isso porque, com base na experiência, não se pode afirmar que a maior parte dos imputados tenha sido declarada inocente ao final do processo. Ademais, a própria imputação se apóia em indícios previamente colhidos contra o processado, o que por si impede que seja presumido inocente. Sustenta ainda que a presunção de inocência, tomada em todas as suas conseqüências, teria que levar, por exemplo, à abolição da prisão cautelar, e tornaria inócua a própria persecução criminal [05].

Importante registrar que não se trata apenas de uma discussão semântica a respeito da propriedade de se utilizar o termo presunção em seu sentido técnico. O embate que se trava traduz, em verdade, duas diferentes concepções político-ideológicas da finalidade do processo penal e das garantias que devem cercar a persecução penal.


Para Manzini, a finalidade do processo penal é comprovar o fundamento da pretensão punitiva do Estado no caso concreto. Ainda que seja relevante a tutela do interesse relativo à liberdade individual, devendo ser assegurado o direito de defesa a fim de evitar erros e arbitrariedades, não se pode confundir esse aspecto do processo com sua finalidade prevalente de realizar a pretensão punitiva do Estado.

Manzini opunha-se assim a Francesco Carrara, o qual partia da premissa de que o processo penal tinha como finalidade própria e específica a proteção dos inocentes frente à atuação punitiva estatal. Sua concepção de processo penal era construída em torno da idéia da presunção de inocência. Nas palavras de Jaime Vegas Torres, Carrara vê tal presunção como "un principio estructurador que extiende su eficacia sobre el proceso penal en su conjunto. Todo el proceso penal se pone al servicio de la presunción de inocencia" [06]


Com efeito, a consagração do princípio da presunção da inocência na Declaração de 1789 reflete uma nova concepção do processo penal defendida por pensadores iluministas em reação ao sistema persecutório que marcara o antigo regime, no qual a prova dos fatos era produzida através da sujeição do acusado à prisão e tormento, com o fim de extrair dele a confissão. É nessa mudança de foco, em que o processo penal deixa de ser um mero instrumento de realização da pretensão punitiva do Estado, para se transformar em instrumento de tutela da liberdade, que está a chave para se compreender o conteúdo e alcance do princípio da presunção de inocência.

A partir dessa premissa, tornam-se irrelevantes as críticas calcadas unicamente na impropriedade terminológica de se presumir inocente aquele que está sendo processado criminalmente. E, como se verá a seguir, acaba por ser irrelevante a diferença que se pretende acentuar entre o texto contido na Declaração de 1789 e o dispositivo constitucional brasileiro [07].

De fato, ainda que a fórmula adotada pela Constituição de 1988 tenha sido engendrada na Itália pós-fascista, a partir das críticas capitaneadas pelas escolas positiva e técnico jurídica à presunção de inocência, o certo é que na prática judiciária brasileira não se estabeleceu diferença entre os princípios da presunção de inocência e da desconsideração prévia de culpabilidade. O exame da jurisprudência de nossos tribunais superiores demonstra que nunca se pôs tal diferença como fundamento para restringir o campo de aplicação do princípio da presunção de inocência. Mais do que isso: as expressões presunção de inocência e presunção de não culpabilidade são utilizadas como se fossem sinônimos [08].

Aplicações do princípio da presunção de inocência. A aplicação mais comumente defendida pela doutrina da norma sob exame dá-se no campo probatório. Nessa primeira formulação, o réu ser presumido inocente significa, por um lado, que o ônus de provar a veracidade dos fatos que lhe são imputados é da parte autora na ação penal (em regra, o Ministério Público) e, por outro lado, que se permanecer no espírito do juiz alguma dúvida, após a apreciação das provas produzidas, deve a querela ser decidida a favor do réu.

Luiz Flávio Gomes registra que a acusação tem o ônus de provar cada um dos fatos que integram o tipo penal e a participação nos mesmos do acusado. Provados "os fatos e a atribuição culpável deles ao acusado", presumem-se contra o réu a ilicitude e a culpabilidade. Caberá então à defesa provar eventuais causas excludentes de ilicitude e de culpabilidade [09]. Vê-se, pois, que há no processo penal, assim como no processo civil, regras de distribuição dos ônus da prova, sendo incorreto afirmar que toda a prova a ser produzida cabe ao Ministério Público.


Qual é então a nota distintiva em matéria probatória que norteia a atuação do juiz criminal, em decorrência da aplicação do princípio da presunção de inocência? Enquanto no direito processual civil, o juiz, ao decidir, se limita a distribuir as regras de ônus da prova, julgando a lide contra a parte que não se desincumbiu do ônus de provar os fatos por ela alegados; no direito processual penal, se ao final o juiz tiver dúvidas a respeito da procedência das alegações do réu, ele deve absolvê-lo ainda que não esteja plenamente convencido daquelas alegações. Em uma palavra, a dúvida não resolvível quanto à matéria de fato é sempre dirimida a favor do réu, independentemente das regras ordinárias de distribuição do ônus da prova.

A mera alegação do réu de que agiu, por exemplo, sob uma excludente de antijuridicidade, não o exime de produzir prova de sua alegação. A solução pro reo só existe se o juiz não chegar a um juízo de certeza contra o réu, ou seja, se ele ficar realmente em dúvida quanto à ocorrência ou não da situação que justificaria sua conduta, em vista da prova produzida.

Alguns autores, entretanto, afirmam que o ônus da prova no processo recai integralmente sobre o Ministério Público. Gustavo Henrique Righi Ivahy Badaró sustenta que o Ministério Público tem o ônus de provar não só a tipicidade, mas também a antijuridicidade e a culpabilidade, pois estas são partes integrantes do fato constitutivo do direito de punir e não, como normalmente se alega, fato impeditivo do direito de punir a ser provado pelo réu. Para o autor, se o réu alega que agiu em legítima defesa está na verdade negando o cometimento do delito, cabendo ao Ministério Público produzir a prova de que a legítima defesa não ocorreu. Parece-me, contudo, que o debate a respeito do ônus da prova subjetivo – se compete ao autor ou ao réu provar a ocorrência da dirimente – deixa de ser relevante diante da afirmação de que no direito processo penal não importa a quem competia produzir a prova de determinado fato, a dúvida será sempre dirimida a favor do réu. Em outras palavras, não importa qual das partes tinha originariamente o ônus de provar. A questão é saber se o juiz decidirá, em caso de dúvida, distribuindo o ônus da prova (julgando a lide contra a parte que não se desincumbiu satisfatoriamente de seu ônus) ou adotando o in dubio pro reo, regra de julgamento que se extrai da presunção de inocência [10].

Mas o princípio da presunção de inocência não se aplica exclusivamente no campo probatório, o in dubio pro reo é apenas uma de suas repercussões. Deve ser dispensado tanto ao investigado quanto ao réu tratamento compatível com seu estado de inocente. A condição de investigado e de réu em processo criminal já traz, por si, indiscutível constrangimento. Em vista disso, todas as medidas restritivas ou coercitivas que se façam necessárias no curso do processo só podem ser aplicadas ao acusado na exata medida de tal necessidade. Se houver várias formas de conduzir a investigação, deve-se adotar a que traga menor constrangimento ao imputado e que enseje a menor restrição possível a seus direitos. Eventual prisão anterior à condenação definitiva, por exemplo, deverá estar pautada em decisão judicial que indique quais circunstâncias presentes no caso concreto autorizam e recomendam a excepcional privação da liberdade do réu. O mesmo ocorre com outras medidas que impliquem em restrição de direitos fundamentais, como se observa da necessidade de que a quebra de sigilo bancário e de comunicação telefônica, ou ainda a busca e apreensão no domicílio do acusado, sejam precedidas de decisão judicial devidamente fundamentada [11].

O impacto da adoção do princípio da presunção da inocência pela Constituição Federal sobre o instituto da prisão cautelar ensejou alguns debates doutrinários que vale a pena registrar. De início sustentou-se que o art. 5º, LVII, da Constituição de 1988, revogara o instituto da prisão cautelar. No entanto tal tese foi logo rechaçada pelo Poder Judiciário, inclusive sob o fundamento de que a própria Constituição Federal referiu-se à prisão em flagrante (modalidade de prisão processual), à liberdade provisória e à fiança (institutos correlatos), respectivamente nos incisos LXI, LXVI, XLIII, XLIV, de seu artigo 5o [12]. Ademais a compatibilidade entre a presunção de inocência e a prisão processual decorre da própria enunciação original do princípio na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, que se refere à possibilidade, ainda que excepcional, de detenção do imputado, o que inclusive ensejou a crítica de Manzini, já exposta acima.

Firmou-se então o entendimento de que a presunção de inocência não impede a decretação das chamadas prisões processuais (prisão em flagrante, temporária, preventiva, e prisão decorrente da pronúncia e da sentença condenatória recorrível, todas previstas em lei). Não obstante, o princípio incide para exigir que o juiz demonstre a ocorrência de fumus boni iuris e periculum in mora (ou periculum libertatis) a autorizar a decretação da custódia cautelar, significando que não são compatíveis com a norma constitucional as prisões processuais obrigatórias, quais sejam, as que decorrem de forma automática de determinado evento processual, ou ainda do cometimento de crimes graves.

Não por acaso houve intenso debate a respeito da constitucionalidade das prisões decorrentes da pronúncia e da sentença condenatória recorrível (artigos 408, § 1º, e 594, do Código de Processo Penal). Enquanto as demais prisões processuais (flagrante, preventiva e mesmo a temporária) estão condicionadas à verificação do periculum libertatis (art. 310, parágrafo único e art. 312, ambos do Código de Processo Penal e art. 2º da 7960/89), essas modalidades – correntemente denominadas de prisões provisórias – prescindiriam de tal requisito. Bastaria que o juiz proferisse a decisão de pronúncia ou a sentença condenatória para que o réu fosse recolhido automaticamente à prisão. A lei só dispensaria a decretação da custódia no caso de o pronunciado/sentenciado ser primário ou possuir bons antecedentes.

Como fruto do questionamento a respeito da constitucionalidade das prisões provisórias foi editada a súmula 09 pelo Superior Tribunal de Justiça, nos seguintes termos: "a exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência". O exame dos julgados que deram origem à súmula demonstra que o debate que se travou naquele momento no âmbito do Superior Tribunal de Justiça referiu-se apenas à compatibilidade do princípio da presunção de inocência com as prisões processuais. Não se chegou a discutir a necessidade de se demonstrar em cada caso a presença do periculum libertatis [13]. O fato é que o próprio STJ temperou posteriormente o entendimento expressado na súmula 9, passando a exigir fundamentação específica sobre a necessidade da decretação da prisão do réu condenado em primeira instância ou pronunciado, especialmente se até ali respondera ao processo em liberdade [14].

Já no que se refere ao Supremo Tribunal Federal, apesar do longo tempo decorrido desde a promulgação da Carta de 1988, seus julgados a respeito da presunção de inocência versus prisões cautelares ainda se apresentam oscilantes. Há acórdãos que procuram dar aos dispositivos legais que prevêem a prisão em decorrência da sentença de 1º grau e da pronúncia interpretação conforme a Constituição Federal, afirmando que a necessidade da custódia cautelar deve estar demonstrada em cada caso [15]. Outros precedentes dispensam tal motivação, partindo da compatibilidade em tese dos dispositivos estudados com o princípio da inocência [16]. Admite-se também a prisão independentemente de fundamentação específica quanto à sua necessidade quando decorre de acórdão condenatório proferido por Tribunal de 2º grau (em vista do efeito meramente devolutivo dos recursos especial e extraordinário) [17] ou ainda no caso em que o réu está sendo acusado de crime hediondo ou assemelhado (incidência da lei 8072/90) [18]. A impressão que se colhe é a de que, apesar de alguns julgados de Turmas do STF afirmarem a necessidade de fundamentação específica para a decretação de prisão processual, dado o princípio da presunção de inocência, prepondera a tendência de temperar o princípio, prestigiando-se a prisão diante da gravidade do crime imputado e quando há grande repercussão do caso na imprensa. [19]

Decorre ainda da aplicação do princípio a vedação de que o investigado ou acusado seja submetido a tratamento humilhante ou exposição indevida, especialmente pelos meios de comunicação. A cobertura jornalística de casos sob julgamento pode produzir efeitos danosos para o réu, especialmente se este já é apresentado inapelavelmente como culpado. A atuação da mídia pode inclusive influenciar de forma decisiva o resultado do julgamento, tema que não é objeto deste estudo [20]. O que ora se sustenta é que, dependendo da forma como são veiculados os fatos pela imprensa, pode estar sendo dispensado ao réu tratamento incompatível com seu estado de inocente.

A hipótese é de colisão de princípios constitucionais. De um lado, o princípio da presunção de inocência; de outro, os princípios da publicidade dos atos processuais [21] e da liberdade de expressão e de informação [22]. A questão proposta se insere em um debate mais amplo a respeito dos mecanismos de controle democrático sobre os veículos de comunicação e proteção a direitos individuais eventualmente lesados pela atividade jornalística, debate ainda incipiente no Brasil, mas que evidentemente ultrapassa o objeto deste estudo [23]. Fica apenas o registro de mais uma repercussão prática do princípio estudado.

Conclusão: Os objetivos colocados no início (fixar o significado do inciso LVII do art. 5º da Constituição Federal de 1988 e examinar sua aplicação na prática judiciária brasileira) podem ser assim resumidos: no que tange à oposição (ou diferenciação) entre o princípio da presunção de inocência e o princípio não-culpabilidade, trata-se de discussão que não se resolve mediante interpretação literal ou recurso ao direito comparado. O significado do enunciado constitucional liga-se, com efeito, ao conceito de sistema punitivo construído a partir de sua compatibilidade com um Estado democrático de direito como é (ou pretende ser) o da República Federativa do Brasil[24].

Nesse diapasão, foi possível demonstrar que o referido enunciado constitucional tem múltiplas repercussões na prática jurídica, das quais são exemplos: o ônus da prova durante o processo penal e seu consectário lógico traduzido na máxima in dubio pro reo; a obrigação de que o Estado trate o acusado, no curso do processo (ou mesmo antes, durante a investigação), com a menor restrição possível a seus direitos fundamentais, preservando-lhe a dignidade e intimidade; a exigência de que a restrição da liberdade do réu seja fundamentada, em cada caso concreto, a partir da demonstração de dados fáticos que comprovem a necessidade da segregação cautelar; e, ainda, cria para os demais particulares a obrigação de dispensar tratamento compatível com o status de inocente presumido (ou seja, de acusado, mas não de condenado; de suspeito, mas não de culpado), sob pena de indevida agressão à privacidade, à imagem e à honra do indivíduo que está submetido a inquérito ou processo penal.


Contudo, essas aplicações não pretendem esgotar as possíveis repercussões do princípio da presunção de inocência no direito pátrio. Ao contrário, assim como o princípio do devido processo legal apresenta inúmeras e diferenciadas repercussões na prática judicial brasileira, exigindo constante atividade hermenêutica pelos operadores do direito para seu o delineamento, é possível que outras aplicações ainda sejam extraídas do enunciado normativo do inc. LVI do art. 5º da Constituição, a partir de novas interpretações orientadas para a perspectiva na qual o acusado seja considerado um cidadão e, portanto, um sujeito de direitos face ao Estado, ao contrário de um mero objeto de investigação, ou pior, um inimigo desse Estado.

Afinal, como consignado no início deste trabalho, a fixação do conteúdo da norma que consagra a presunção de inocência reflete uma tomada de posição sobre os fins que devem pautar a atividade do Estado no âmbito da persecução penal. Portanto, partindo-se da concepção de um sistema punitivo em que a regra é a prevalência da liberdade sobre a atividade repressiva estatal, o princípio da presunção de inocência atuará como "critério inspirador de todo el ordenamiento procesal penal, imponiendo el modelo procesal de corte liberal centrado en las garantias del inculpado frente a la actuación punitiva estatal" [25].

Notas:


01 Em interessante precedente (RE 86297-SP) o Supremo Tribunal Federal debateu a vigência e conteúdo do princípio da presunção de inocência sob a égide da Constituição Federal de 1969. Na ocasião, examinou-se a suposta inconstitucionalidade do art. 1º, item I, alínea n, da Lei Complementar 05/70, que considerava inelegíveis para qualquer cargo eletivo os que respondessem a processo judicial pela prática de determinados crimes. Destaque para o voto vencido do Ministro Leitão de Abreu que discorreu longamente a respeito da necessária subordinação das normas ordinárias aos princípios fundamentais estabelecidos nas Declarações de Direitos, ainda que não consagrados expressamente na Constituição Federal. A tese que prevaleceu, todavia, explicitada no voto do Ministro Thompson Flores, apesar de admitir a vigência do princípio, dava-lhe aplicação mais restrita, em vista do que a norma sob exame foi declarada constitucional.

02 A respeito do debate travado pelas escolas penais italianas sobre o princípio da presunção da inocência, de um lado a escola clássica, cujo expoente máximo era Francesco Carrara, e de outro as escolas positivista e técnico jurídica, representadas por Enrico Ferri e Vicenzo Manzini, ver: TORRES, Jaime Vegas: Presunción de inocencia y prueba em el proceso penal. Madrid: La ley, 1993.

03 "El positivismo criminológico, tan adepto a razonamientos empíricos, con desprecio da las previsiones normativas, llegó a definir como absurda esta garantia de la seguridad individual, al menos en ciertos casos (confesión, delito en flagrante, delincuentes habituales, reincidentes o por tendencia); para ellos, la hipótesis sólo sería admisible si se trata de un delincuente ocasional que ha rechazado la imputación, y, aun en ese caso, durante cierto período del procedimiento, porque el encarcelamiento preventivo, fundado en la sospecha evidente o en la probabilidad de que la imputación sea cierta, la remisión a juicio del acusado, la sentencia no firme, y hasta la misma imputación fundada que abre una persecución penal, revelan que al imputado no se lo presume inocente sino, antes bien, culpable". In MAIER, Julio B. J.: Derecho Procesal Penal. Tomo I. Fundamentos. Buenos Aires: Editores Del Puerto s.r.l, 2002, p. 492.

04 MANZINI, Vicenzo: Tratado de Derecho Procesal Penal. volume ITraduccion de Santiago Sentis Melendo y Marino Ayerra Redín. Buenos Aires: Librería El Foro, 1996, p. 255.

05 "La degeneración de la máxima comenzó con la declaración de los derechos del hombre y del ciudadano: ‘IX: Debiéndose presumir inocente todo hombre mientras no se lo haya declarado culpable, si su arresto hubiere sido declarado indispensable, debe ser reprimido severamente por la ley todo rigor que no sea necesario, para seguridad de su persona’. Pero qué razón puede haber para considerar indispensable el arresto de quien se presume ser inocente? Aunque hubiese un interés, el acto sería igualmente muy inícuo. Y, por tanto, es lógico lo que decía Roberpierre, en la Convención nacional de 1792 cuando se discutía si proceder o no contra Luis XVI: ‘Si, como se usa en los juicios, se lo debiera presumir inocente mientras no fuera condenado, todos nosotros seríamos reos’. MANZINI, ob. cit., p. 254.

06 "...el ‘postulado fundamental del cual parte la ciencia penal’ en sus estúdios acerca del procedimiento, el principio del que han de derivarse todos los limites que las formas procesales imponen a la actividade punitiva estatal, no es otro que la presunción de inocência. Esta presunción ‘se toma de la ciencia penal, que de ella ha hecho su bandera, para opornela al acusador y al investigador, no con el fin de detener sus actividades en su legítimo curso, sino con el objeto de restringir su acción, encadenándola a una serie de preceptos que sirvan de freno al arbitrio, de obstáculo al error, y, por consiguiente, de protección a aquel individuo’ (...) Así, en Carrara, el contenido de la presunción de inocencia alcanza su máxima amplitud: todos y cada uno de los momentos des proceso penal, todas y cada una de las reglas que lo disciplinan, encuentran su fundamento en la protección de la inocencia, de tal forma que la infracción de cualquiera de esas reglas se convierte en un ataque dirigido, en último término, contra la propia presunción de inocencia". in Torres, Jaime Vegas, ob. cit., p. 22/23.

07 Respondendo ao questionamento sobre se a presunção de inocência se consubstancia tecnicamente em uma presunção, aduz Helena Magalhães Bolina: "A qualificação jurídica do princípio da presunção da inocência não parece revestir importância essencial. Ele não se justifica por questões de técnica jurídica, trata-se de um princípio estruturador do processo penal, baseado numa opção política, que resulta da convicção de que essa é a melhor forma de garantir o respeito pela dignidade humana, em sede de perseguição penal." in Razão de ser, significado e conseqüências do princípio da presunção de inocência (art. 32°, n° 2, da CRP). Boletim da Faculdade de Direito. Coimbra. Vol. 70. 1994. p. 456. No mesmo sentido, Julio B. J. Maier: "’Presumir inocente’, ‘reputar inocente’ o ‘no considerar culpable’ significan exactamente lo mismo; y, al mismo tiempo, estas declaraciones formales mentan el mismo principio que emerge de la exigencia de un ‘juicio previo’ para infligir una pena a una persona. (...) Se trata, en verdad, de un punto de partida político que asume – o debe asumir – la ley de enjuiciamiento penal en un Estado de Derecho, punto de partida que constituyó, en su momento, la reacción contra una manera de perseguir penalmente que, precisamente, partía desde o extremo contrario". Ob. cit., p. 491/492.

08 Os seguintes julgados do Superior Tribunal de Justiça referem-se ao princípio da inocência: RHC 11387/SP; HC 13725/RJ; RHC 9745/PR; RHC 8167/SP. Já estes outros: RESP 304521/SP; HC 32491/MS; HC 16541/SP; HC 28177/MS - remetem ao princípio da não culpabilidade; e estes últimos: HC 19711/SP; RHC 15139/SP; HC 30186/SP; HC 31662/RS; HC 33457/SP - citam ambos como sinônimos. Todos os julgados citados tratam contudo do mesmo princípio. A reforçar o ora sustentado, veja-se ainda o seguinte acórdão do Supremo Tribunal Federal: "I. Prisão por pronúncia de réu já anteriormente preso: pressuposto de validade da prisão cautelar anterior. 1. Em princípio, se tem dispensado a motivação, na pronúncia, da manutenção da prisão preventiva anterior; com maior razão, se tem considerado suficiente que a pronúncia se remeta no ponto aos motivos da prisão cautelar que mantém. 2. Essa orientação pressupõe, contudo, a validade da prisão cautelar antes decretada (precedentes): se é nulo o decreto originário da preventiva, a nulidade contamina a prisão por pronúncia que só nela se fundar. II. Prisão preventiva: motivação inidônea. O apelo à preservação da "credibilidade da justiça e da segurança pública" não constitui motivação idônea para a prisão processual, que - dada a presunção constitucional da inocência ou da não culpabilidade - há de ter justificativa cautelar e não pode substantivar antecipação da pena e de sua eventual função de prevenção geral". (HC 82797/PR - Relator SEPÚLVEDA PERTENCE Julgamento: 01/04/2003 - DJ 02-05-2003 - Primeira Turma - Unânime).

09 GOMES, Luiz Flávio: Sobre o conteúdo processual tridimensional da presunção de inocência. In GOMES, Luiz Flávio: Estudos de Direito Penal e Processual PenalSão Paulo: RT, 1999, p. 111/112.

10 Veja-se o seguinte trecho do próprio autor ora estudado: "Um aspecto relevante da presunção de inocência enquanto regra de julgamento é que, no processo penal, diversamente do que ocorre no campo civil, não há verdadeira repartição do ônus da prova. O ônus da prova não supõe que exista, necessariamente, uma repartição de tal ônus. Mesmo que não haja repartição do ônus da prova é necessário que haja regra de julgamento, determinando que em qualquer caso, a dúvida sobre fato relevante será decidida sempre contra o autor ou então contra o réu. No caso do processo penal o in dúbio pro reo é uma regra de julgamento unidirecional. O ônus da prova incumbe inteiramente ao Ministério Público, que deverá provar a presença de todos os elementos necessários para o acolhimento da pretensão punitiva. Para usar a regra do processo civil, ao Ministério Público caberá não só o ônus da prova da existência do fato constitutivo do direito de punir, como também da inexistência dos fatos impeditivos de tal direito". in Ônus da prova no processo penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 296/297.

11 O art. 2º da lei de interceptação das comunicações telefônicas (lei 9296/96) é um bom exemplo da excepcionalidade que deve pautar o deferimento de prova que implique em restrição a direito fundamental do imputado.

12 nesse sentido: HC 67.707, Relatado pelo Ministro Celso de Mello e julgado pela 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, em 7.11.89, julgamento unânime.

13 Com efeito, os acórdãos que deram origem à sumula 09, quais sejam, HC 84-SP, RHC 303-MG, RHC 331-SO, RHC 202-SP, RHC 270-SP, HC 102-RJ, todos proferidos entre setembro de novembro de 1989, simplesmente não abordaram a questão da excepcionalidade da prisão processual em decorrência do princípio da inocência. Veja-se a título ilustrativo os seguintes trechos dos votos condutores dos julgados referidos: "se é certo que o magistrado de primeiro grau pode decretar a prisão preventiva de acusados, com muito mais força se me afigura a prisão decorrente da própria sentença condenatória, confirmada em segundo grau, onde se procedeu a um juízo sobre a autoria do delito e da culpabilidade, após avaliar-se a prova, colhida sob a garantia do contraditório."(HC 84-SP); "A prisão de natureza processual não infirma a presunção de inocência do acusado. E, a contrario sensu do disposto no item LXVI, do mesmo art. 5º (...) verifica-se que a Constituição não se pôs a vedar a prisão de natureza processual"(HC 303-MG); "...a pessoa, nessa fase [durante a tramitação do processo], tem sua culpabilidade posta em dúvida, circunstância que não obsta a observância das regras que a lei impõe para a manutenção de sua liberdade. Sequer o conceito ínsito no art. 5º, LVII, da recém promulgada Constituição Federal, pode servir de pretexto para oposição a tal entendimento, porquanto a própria Lei Fundamental, no item LXI, do mesmo dispositivo permite a custódia quando ordenada pela autoridade judiciária." (HC 331-SP); "(...) o dispositivo constitucional invocado deve ser interpretado em consonância com os demais textos que disciplinam a prisão, não sendo correto sustentar somente ser possível, depois da vigência da nova Constituição a prisão de quem já tenha sido definitivamente condenado. (...) A ordem de recolher-se à prisão para possibilitar o processamento de recurso não significa considerar culpado. É regra procedimental condicionante de processamento do recurso; vale dizer: a apelação só é admissível se processada na forma da lei" (RHC 202-SP); "Quanto ao art. 5º, LVII, da Constituição, esta Turma por mais de uma vez já decidiu que não cuida da prisão provisória processual, regulada em outro inciso (LXI) que expressamente a permite dentro de certas condições (prisão em flagrante ou a decorrente de ordem judicial). Não há, pois, a alegada incompatibilidade entre a garantia constitucional da presunção de inocência e a prisão provisória, como providência cautelar, antes ou no curso do processo, nas hipóteses previstas no Código de Processo Penal. No caso, a prisão decorre de mandado judicial, apoiado no art. 393, I, do Código de Processo Penal. (RHC 270-SP); "(...) inexiste incompatibilidade entre os princípios constitucionais (art. 5º, incisos LVII e LXVI) e a disposição do art. 594 do CPP. O inciso LXVI expressa que ‘ninguém será levado à prisão ou nela mantido quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança’. Pode, a lei, assim, indicar os casos em que não será admitida a liberdade provisória, ou só admitir a liberdade provisória nas hipóteses que menciona, embora o réu não seja, ainda, considerado culpado, conceito só aplicável com o trânsito em julgado da sentença condenatória". (HC 102-RJ).

14 Nesse sentido: Processual penal. Sentença condenatória. Apelação em liberdade. Negativa desmotivada. Princípio da inocência presumida. Constrangimento ilegal. Habeas corpus. - Sob o império da nova ordem constitucional, que proclamou o princípio da inocência presumida, a regra do art.594, do CPP, deve ser concebida com cautela, sendo cabível tão-somente quando objetivamente indicado na sentença condenatória a necessidade da prisão provisória. - Se o réu permaneceu em liberdade durante o longo curso da instrução criminal e não se demonstrou no dispositivo da sentença, presença de alguma das circunstâncias inscritas no art. 312, do CPP, a exigência de recolhimento a prisão para apelar é descabida, passível de desconstituição por via de habeas-corpus, sendo irrelevante a circunstância de se tratar de crime hediondo e a referência à vileza da conduta criminosa. - Recurso ordinário provido. "Habeas corpus" concedido. (RHC 8167 / SP; DJ 05/04/1999; Relator Vicente Leal; Sexta Turma. Unânime). Processual penal. "Habeas corpus" substitutivo de recurso ordinário. Apelo em liberdade. Decisão não fundamentada. Ré que se defendeu solta. Arts. 35 da lei nº 6.368/76 e 2º, § 2º da lei nº 8.072/90. Embora o princípio da inocência não seja incompatível com a exigência da prisão provisória na fase de apelação (Súmula nº 09/STJ), é bem de ver que a segregação antecipada aí deve ser concretamente fundamentada quando se trata de sentenciada que respondeu o feito em liberdade. "Writ" concedido. (HC 8062/SP; DJ 22/02/1999; Relator Felix Fischer; Quinta Turma, Unânime)

15 E M E N T A: (...) A privação cautelar da liberdade individual reveste-se de caráter excepcional, somente devendo ser decretada em situações de absoluta necessidade. A prisão preventiva, para legitimar-se em face de nosso sistema jurídico, impõe - além da satisfação dos pressupostos a que se refere o art. 312 do CPP (prova da existência material do crime e indício suficiente de autoria) - que se evidenciem, com fundamento em base empírica idônea, razões justificadoras da imprescindibilidade dessa extraordinária medida cautelar de privação da liberdade do indiciado ou do réu. (...) A prisão preventiva não pode - e não deve - ser utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois, no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas, prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia. A prisão preventiva - que não deve ser confundida com a prisão penal - não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua decretação, mas destina-se, considerada a função cautelar que lhe é inerente, a atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal. (...) O estado de comoção social e de eventual indignação popular, motivado pela repercussão da prática da infração penal, não pode justificar, só por si, a decretação da prisão cautelar do suposto autor do comportamento delituoso, sob pena de completa e grave aniquilação do postulado fundamental da liberdade. O clamor público - precisamente por não constituir causa legal de justificação da prisão processual (CPP, art. 312) - não se qualifica como fator de legitimação da privação cautelar da liberdade do indiciado ou do réu, não sendo lícito pretender-se, nessa matéria, por incabível, a aplicação analógica do que se contém no art. 323, V, do CPP, que concerne, exclusivamente, ao tema da fiança criminal. Precedentes. - A acusação penal por crime hediondo não justifica, só por si, a privação cautelar da liberdade do indiciado ou do réu. (...)A prerrogativa jurídica da liberdade - que possui extração constitucional (CF, art. 5º, LXI e LXV) - não pode ser ofendida por interpretações doutrinárias ou jurisprudenciais, que, fundadas em preocupante discurso de conteúdo autoritário, culminam por consagrar, paradoxalmente, em detrimento de direitos e garantias fundamentais proclamados pela Constituição da República, a ideologia da lei e da ordem. Mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática de crime hediondo, e até que sobrevenha sentença penal condenatória irrecorrível, não se revela possível - por efeito de insuperável vedação constitucional (CF, art. 5º, LVII) - presumir-lhe a culpabilidade. Ninguém pode ser tratado como culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito, decisão judicial condenatória transitada em julgado. O princípio constitucional da não-culpabilidade, em nosso sistema jurídico, consagra uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados definitivamente por sentença do Poder Judiciário. (HC 80719/SP; Relator CELSO DE MELLO; Julgamento: 26/06/2001, Segunda turma, DJ 28-09-01, Unânime).

16 EMENTA: - Recurso em "habeas corpus". - Aplicação, no caso, do artigo 594 do Código de Processo Penal, que, conforme o entendimento de ambas as Turmas desta Corte, não foi revogado pelo princípio constitucional da presunção de inocência. Precedentes do S.T.F. Recurso a que se nega provimento. (RHC 81946/SP; Relator MOREIRA ALVES; Julgamento: 11/06/2002; Primeira Turma; DJ 16-08-02; Unânime).

17 EMENTA: Habeas corpus. 2. Decisão condenatória. Determinação de imediata prisão do condenado. 3. Princípio da presunção de inocência. Art. 5º, LVII, da Constituição Federal. 4. Não possuindo os recursos de natureza extraordinária efeito suspensivo do julgado condenatório, não fere o princípio de presunção de inocência a determinação de expedição do mandado de prisão do condenado. Precedentes. 5. Habeas corpus indeferido. (HC 81685/SP; Relator NÉRI DA SILVEIRA; Julgamento: 26/03/2002; Segunda Turma; DJ 17-05-02; Unânime). "... O princípio constitucional da não-culpabilidade do réu não impede a efetivação imediata da prisão, quando o recurso por ele interposto não possua efeito suspensivo, como ocorre com o recurso extraordinário e o recurso especial. Precedentes. 5 - Habeas corpus indeferido". (HC 81964/SP; Relator GILMAR MENDES; Julgamento: 10/12/2002; Segunda Turma; DJ 28-02-2003; Unânime); EMENTA: CONSTITUCIONAL. PENAL. PROCESSUAL PENAL. NÃO-CULPABILIDADE: PRESUNÇÃO. RECURSO ESPECIAL: PRETENSÃO DE AGUARDAR EM LIBERDADE O JULGAMENTO: IMPOSSIBILIDADE. C.F., art. 5º, LVII. I. - O benefício de recorrer em liberdade não tem aplicabilidade relativamente aos recursos especial e extraordinário, que não têm efeito suspensivo, o que não é ofensivo à presunção de não-culpabilidade inscrita no artigo 5º, LVII, da Constituição Federal. II. - Precedentes do STF: HC 72.366-SP, Néri, Plenário, "D.J." 26.11.1999; HHCC 72.061-RJ e 74.983-RS, Velloso, Plenário, "D.J." 09.6.1995 e 29.8.1997, respectivamente; HC 73.151-RJ, M. Alves, 1a. Turma, "D.J." 19.04.96; HC 69.263-SP, Velloso, 2a. Turma, RTJ 142/878; HC 71.443-RJ, Rezek, 2a. Turma, RTJ 159/234. III. - Improcedência da alegação de prejuízo irreparável decorrente da perda da função pública. IV. - Recurso improvido. (RHC 81786 / SC; Relator CARLOS VELLOSO; Julgamento: 02/04/2002; Segunda Turma; DJ26-04-2002; Unânime).

18 EMENTA: Habeas corpus. 2. Superior Tribunal de Justiça. 3. Duplo homicídio qualificado. 4. Crime hediondo. 5. Apelação em liberdade. 6. Repugna-se a fundamentação de prisão cautelar assente simplesmente em clamor público. 7. Da leitura do § 2º, do art. 2º, da Lei nº 8.072, de 25.07.90, extrai-se que a regra é a proibição de se apelar em liberdade, que só pode ser afastada mediante decisão fundamentada do juiz. Precedentes. 8. Habeas corpus indeferido (HC 82770 / RJ; Relator CELSO DE MELLO; Rel. Acórdão GILMAR MENDES; Julgamento: 27/05/2003; Segunda Turma; DJ -05-09-2003; maioria)

19 É ilustrativo de tal tendência o julgamento de habeas corpus impetrado em favor do juiz Nicolau dos Santos Neto (HC 80717-8-SP, julgado pelo Plenário do STF em 13.6.2001), ocasião em que se travou interessante debate sobre a significação de "garantia da ordem pública", uma das hipóteses legais em que se justifica a decretação da prisão preventiva e a manutenção da prisão em flagrante. A prisão preventiva do réu havia sido decretada para assegurar a credibilidade e respeitabilidade das instituições públicas, tendo considerado ainda a magnitude da lesão causada. Tais fundamentos foram considerados insuficientes, em face do princípio da presunção da inocência, pelo Relator, Ministro Sepúlveda Pertence. Prevaleceu no entanto entendimento diverso capitaneado pela Ministra Ellen Gracie, tendo sido denegada a ordem.

20 A respeito, ver SCHREIBER, Simone: Colisão de direitos fundamentais - Uma investigação sobre as conseqüências e formas de superação do confronto entre o direito a um julgamento justo e imparcial e a liberdade de expressão e informaçãoProjeto de tese apresentado como requisito para ingresso no Programa de Pós-Graduação em Direito, para 2003, Curso de Doutorado, área de concentração Direito Público, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ, sob a orientação do Professor Luís Roberto Barroso, Mimeo, Setembro de 2002.

21 O princípio da publicidade "possibilita o controle social (público) da atividade jurisdicional, protege as partes de uma justiça subtraída ao controle público, incrementa a confiança da comunidade na Justiça especialmente porque tornam-se conhecidos os motivos e critérios das decisões, evita a prática de arbitrariedades, é freio e uma garantia contra a tirania judicial, otimiza o direito à informação (seja no aspecto de informar, seja no de ser informado), assegura a independência judicial contra as ingerências externas ou internas, etc" GOMES, Luiz Flávio: As garantias mínimas do devido processo criminal nos sistemas jurídicos brasileiro e interamericano: um estudo introdutório. In GOMES, Luiz Flávio e PIOVESAN, Flávia (coord.): O sistema interamericano de proteção dos direitos humanos e o direito brasileiro. São Paulo: RT, 2000, p. 240. É no mesmo sentido a lição de Antônio Magalhães Gomes Filho. Para o autor, a publicidade "constitui uma garantia política de maior envergadura, sendo inseparável da própria idéia de democracia, expressando acima de tudo uma exigência de transparência nos assuntos públicos, sem a qual não seriam possíveis ou legítimos os controles populares sobre o exercício do poder", in A motivação das decisões penais. São Paulo: RT, 2001, p. 48

22 "A relevância da liberdade de informação e expressão em um regime democrático reside no papel que desempenha na articulação do debate público e na formação da opinião pública pluralista. Afinal, o cidadão, em uma democracia, tem que estar informado da opinião dos outros e habilitado a formar suas próprias, qualificando-se assim para tomar as decisões políticas que lhe competem. E, além disso, tal liberdade é fundamental para a concretização da transparência no trato da coisa pública, a qual é por sua vez imprescindível ao controle pela população da atuação dos órgãos estatais". SCHREIBER, Simone: Colisão de direitos fundamentais... cit., p. 33.

23 A respeito ver: CERVINI, Raúl: Os processos de descriminalização. São Paulo: RT, 1995; FARIAS, Edilson Pereira de: Colisão de direitos. A honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a liberdade de expressão e informaçãoPorto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 1996; TORON, Alberto Zacharias. Notas sobre a mídia nos crimes de colarinho branco e o judiciário: os novos padrões. Revista Brasileira de Ciências Criminais, n° 36. São Paulo: RT, 2001, p. 257 e ss; Manuel da Costa Andrade. Liberdade de Imprensa e Tutela Penal da Privacidade – a Experiência Portuguesa. Revista Brasileira de Ciências Criminais, nº 20. São Paulo: RT. 1997. p. 27. BATISTA, Nilo. Mídia e sistema penal no capitalismo tardio. Revista Brasileira de Ciências Criminais, n° 42. São Paulo: RT, 2003, p. 242 e ss.

24 O modelo garantista de sistema punitivo é aquele que mais se compatibiliza do arcabouço filosófico, político e jurídico que estrutura o Estado democrático de direito, opondo-se a modelos totalitários e irracionais de persecução penal. "Ferrajoli destaca que se a hipótese acusatória não puder ser comprovada por meio da verdade processual, deverá prevalecer a presunção de falsidade dessa hipótese (presunção de inocência do acusado), tomando-se esse formalismo no direito penal e processual penal como uma garantia da liberdade individual contra a busca por ‘verdades substanciais’ de cunho evidentemente autoritário e totalitário. Isso decorre da premissa epistemológica de que não há ‘uma’ verdade a ser encontrada e que a única verdade que pode justificar uma condenação penal é verdade processual, a qual, justamente por isso, está condicionada em si mesma pelo respeito aos procedimentos e às garantias de defesa.


Com efeito, no modelo de ‘direito penal máximo’ é inegável a aspiração totalitária e irracional, traduzida pela pretensão de que nenhum culpado fique impune à custa da incerteza de que algum inocente possa ser punido, ao passo que o ‘direito penal mínimo’ e a teoria garantista propugnam o objetivo exatamente oposto, ou seja, a construção de um sistema destinado a fazer com que nenhum inocente seja punido, à custa de que algum culpado não o seja.

O in dubio pro reu não é o único critério para solução de incertezas jurisdicionais, mas, antes de tudo, uma escolha política que traduz uma aproximação com a racionalidade do sistema punitivo e a constatação de que na decisão penal deve, necessariamente, estar presente a certeza subjetiva da cognição. O julgador deve estar convicto e expressar essa convicção mediante a demonstração de que os fatos empíricos imputados foram comprovados no decorrer de um procedimento impulsionado pelo cognitivismo processual, ou seja, excluindo da sua motivação qualquer espécie de valoração baseada em outra modalidade de conhecimento." AMARAL, Thiago Bottino do:Critérios para a Ponderação no Direito Penal e Processual Penal: O Aporte da Teoria Garantista ao Debate Brasileiro sobre Direitos Fundamentais. Dissertação apresentada como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Teoria do Estado e Direito Constitucional do Departamento de Direito da PUC-Rio. Mímeo, Abril de 2004.”



Senhores, vejamos outra matéria relacionada a esse respeito, da lavra do Doutor Edinaldo de Holanda Borges, subprocurador-geral da República, verbis:

O Supremo Tribunal Federal (STF) estipula que o réu pode recorrer em liberdade até decisão em última instância. A pergunta a ser feita é: que réu?
Há 400 mil presos nas penitenciárias – superlotadas, diga-se de passagem - brasileiras. E foram decisões de 1° instância, no máximo de 2°, que os colaram lá. Além, é claro, daqueles que nem mesmo são julgados, por logo serem executados por homens – que deveriam ser – da lei.

Não se tem notícia de que a nenhum desses presos tenha sido concedida a espera do julgamento em liberdade. Esses indivíduos, em sua grande maioria, não têm recursos para pagar um “bom advogado”, aquele que livra a cara dos que tem dinheiro, não importando o tamanho do problema em que estejam metidos.

O Caso Battisti só veio nos puxar as orelhas e lembrar a grande diferença existente entre acusados ricos e pobres no sistema judiciário brasileiro. Onde já se viu um injusto Sistema Judiciário como o nosso, questionar uma decisão tomada por juízes italianos metendo o bedelho na autonomia do país europeu?

Se o ministro da Justiça, Tarso Genro, estivesse preocupado com a “liberdade e integridade física” de alguém – e se fosse esse o real motivo a dar à Battisti asilo político – não veríamos as trilhares injustiças a cada esquina e a cada página virada de jornal.
'O princípio constitucional da presunção de inocência constitui regra para a proteção do indivíduo contra o poder. A questão atual, ao contrário, é a proteção do poder, contra o indivíduo'

A preocupação do povo em manifestar perante o Congresso Nacional a necessidade do estabelecimento de regras para a seleção de candidatos ao exercício de cargos eletivos revela a situação de desespero da opinião pública contra a escalada da corrupção em nosso país. O ato encontrou imediata contestação de políticos e até de representante da Ordem dos Advogados do Brasil.

Duas posições ou correntes de opinião foram criadas, a do povo e a dos contestadores. Os que se opõem à proposição, como apresentada, argúem a falta de certeza da responsabilidade do acusado, quando a condenação emanou do magistrado singular, em primeira instância. O juiz, afirmam, está sujeito como qualquer mortal à possibilidade do erro. Em razão, só o julgamento colegiado, de segunda instância, traduziria a certeza inquestionável da culpa, para impossibilitar o registro da candidatura.

A posição do povo é diferente. A relevância do serviço público, de administração ou de representação popular, exige, para a sua composição, a certeza da honestidade de seus agentes. Inverte-se o raciocínio a favor da sociedade. Não só a certeza da culpa é necessária para limpeza do serviço público. Basta que haja veementes indícios para que a opinião pública, o senso comum, rejeite o candidato. Isso porque os indícios já são qualificados pelo requisito da evidência, para que a preservação da sociedade prevaleça sobre o pleito individual da candidatura.

Resta a reunião dos elementos para que o indício se torne qualificado como veemente. O fato tido como delituoso apresenta-se inicialmente em forma de notícia (notitia criminis), o que autoriza a investigação pelos órgãos de repressão. O inquérito, como procedimento inicial, termina com um relatório da autoridade, que pode concluir pelo indício da culpa. É o primeiro juízo de existência do indício. A autoridade policial remete ao Ministério Público que, ao formular a acusação, manifesta o segundo juízo de existência do indício. O juiz então decide pelo recebimento da acusação, formulando o terceiro juízo de existência do indício.

Até então, apesar da constatação de três juízos de indícios da materialidade do crime e de sua autoria, o acusado ainda não teve oportunidade de defesa. Estabelece-se, em seguida, o curso processual, com o contraditório e ampla defesa. No final, o Juiz profere decisão condenatória que, na doutrina processual constitui a transformação dos indícios em reconhecimento da prova produzida. É o quarto juízo de culpa, quando os indícios foram convertidos em prova.

É preciso mais ainda para afastar o candidato duvidoso do acesso aos cargos de soberania nacional? Será que todo esse decurso processual ainda não produziu indícios veementes para a salvaguarda do poder público?

Mas não é só. Se durante todo esse procedimento, houver fato incontestável que exclua a materialidade do delito ou a sua autoria, ainda cabe o recurso do habeas corpus, inclusive para os tribunais superiores. Se isso não ocorreu ou foi julgado no sentido da manutenção do processo, não há como desdizer a palavra do juiz monocrático e de todos os acusadores, sob o falso apanágio do erro humano.

Depois de que, se a sociedade exige para a profilaxia de seu poder público e para evitar a candidatura a cargos eletivos, não a certeza, mas indícios veementes de culpa da prática delituosa, não é possível dizer que o julgamento condenatório em primeira instância não seja suficiente. O raciocínio em contrário peca pelo excesso de zelo na proteção individual, em detrimento da coletividade. Repita-se: não é preciso a certeza da culpa, mas indícios veementes, para evitar a contaminação do poder.

No caso, não se conduz o raciocínio pelo princípio constitucional da presunção de inocência. O referido princípio constitui regra para a proteção do indivíduo contra o poder. A questão atual, ao contrário, é a proteção do poder, contra o indivíduo. O conflito de valores se dinamiza pela prevalência da intangibilidade do Estado, no confronto com o direito individual, por causa da supremacia do interesse público, tendo em vista a sua preservação. Só quando está em jogo a integridade do poder é que os seus valores prevalecem sobre os valores individuais.



Por fim, senhores, vejamos agora um exemplo, apenas um exemplo, de uma petição ao Poder Judiciário contra o desrespeito ao princípio da Presunção de Inocência, verbis:


EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA ª VARA FEDERAL DO RIO DE JANEIRO – SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO


FULANO DE TAL, brasileiro, casado, militar, portador da cédula de identidade nº ____-0/Ministério da Defesa, inscrito no cadastro de pessoas físicas do Ministério da Fazenda sob nº ____, domiciliado na cidade de ____, neste Estado de ____, onde reside na Rua ____, nº ____, Bairro ____, por seu advogado, com escritório na cidade de ____, Estado de ____, na Rua ____, nº ____ Bairro ____, CEP ____, telefone/fax: (00) ____, onde recebe avisos, notificações e intimações (instrumento de mandato anexo), vem respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, propor ação de indenização por danos morais, de procedimento ordinário, em face da União Federal, pessoa jurídica de direito público, inscrição no cadastro nacional de pessoas jurídicas do Ministério da Fazenda nº ____, com endereço na cidade de ____, neste Estado de ____, na Rua _____, nº ____, CEP: ____, conforme razões de fato e de direito que passa a aduzir em conforto do pedido de tutela jurisdicional afinal exposto:

DOS FATOS QUE ANTECEDERAM A DEMANDA


O Autor é militar e os fatos a seguir narrados reclamam providências do Poder Judiciário como a indenização por danos morais.


Considerando-se a abrangência da demanda, o Autor estabelecerá a seguir, para melhor compreensão, a exata seqüência dos fatos ocorridos em compartimentos específicos.


No ano de 2011, o Autor estava lotado no _______, sediado na Avenida ____,  nº ____, Rio de Janeiro – RJ e prestava serviços no Setor de Licitação e Aquisições, daquela Organização Militar.


Ocorre que autor, quando da efetivação de uma aquisição, licitada, autorizada e publicada em Boletim Interno, como Oficial Chefe do Setor de Licitação e Aquisições, ____.


O Autor, em razão das normas previstas nos regulamentos internos e normas legais que regem os contratos licitatórios, fez com que todas as ordens relativas aos procedimentos operacionais padrão fossem cumpridos à risca por seus auxiliares sob seu comando, a saber, ____.


O Autor, dessarte, esclareceu que em virtude da ____. Verifica-se que o Autor apenas cumpriu sua obrigação____. E, assim, ____.


Por conseguinte, e para total surpresa do Autor, decorrido algum tempo, este foi instador a prestar esclarecimento sobre ____, o que no final restou-lhe a amargura de passar a situação de sub-judice, sobrevindo nefastas consequências para sua carreira profissional e estabilidade emocional e financeira. Registre-se que Autor foi ____.


Em face das circunstâncias aqui abordadas, Excelência, o Autor recorreu judicialmente das decisões proferidas pelas autoridades que ____, isto, óbvio, além da angústia e ansiedade durante todo o processo, e durante o recurso interposto na tentativa de ____, razão pela qual não restou alternativa que não a via judicial, considerando os fatos aqui narrados, ante as nítidas violações constitucionais, os quais reclamam pedido de indenização por danos morais, a ser tratado em compartimento próprio.

DA RESPONSABILIDADE DA UNIÃO


Evidente que a União responde pelos atos comissivos ou omissivos de seus prepostos, onde estão inseridos os militares. E, neste particular, o Procurador de Justiça do Estado de Rio de Janeiro, aposentado, e Professor José dos Santos Carvalho Filho, ministra com muita propriedade, in verbis:


A expressão agentes públicos tem sentido amplo. Significa o conjunto de pessoas que, a qualquer título, exercem uma função pública como preposto do Estado. Essa função, é mister que se diga, pode ser remunerada ou gratuita, definitiva ou transitória, política ou jurídica. O que é certo é que, quando atuam no mundo jurídico, tais agentes estão de alguma forma vinculados ao Poder Público. Como se sabe, o Estado só se faz presente através das pessoas físicas que em seu nome manifestam determinada vontade, e é por isso que essa manifestação volitiva acaba por ser imputada ao próprio Estado. São todas essas pessoas físicas que constituem os agentes públicos.” (página 475).


Considerando-se as condutas adotadas pelas autoridades militares que permitiram a concretização dano ao Autor, ensejando o dever de indenizar os danos morais – por parte da Ré, nos termos do artigo 37, § 6°, da Carta da República, in verbis:


Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(…)
§ 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”.
O artigo 43, do Código Civil, por seu turno, não discrepa da Constituição Cidadã, como se infere de sua redação, in verbis:
Art. 43. As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo”.


Inegável, portanto, a responsabilidade da Ré pelos atos praticados por seus agentes públicos. A responsabilidade da Ré, no entanto, há de ser objetiva, por força do artigo 37, § 6°, da Carta da República e, também, do artigo 43, do Código Civil.


Sobre o tema responsabilidade objetiva, afirma a doutrina, como bem observa o Professor José dos Santos Carvalho Filho2, in verbis:
A marca característica da responsabilidade objetiva é a desnecessidade de o lesado pela conduta estatal provar a existência da culpa do agente ou do serviço. O fator culpa, então, fica desconsiderado como pressuposto da responsabilidade objetiva.
Para configurar-se esse tipo de responsabilidade, bastam três pressupostos. O primeiro deles é a ocorrência do fato administrativo, assim considerado como qualquer forma de conduta, comissiva ou omissiva, legítima ou ilegítima, singular ou coletiva, atribuída ao Poder Público (…)
O segundo pressuposto é o dano. Já vimos que não há falar em responsabilidade civil sem que a conduta haja provocado um dano. Não importa a natureza do dano: tanto é indenizável o dano patrimonial como o dano moral (…)
O último pressuposto é o nexo causal (ou relação de causalidade) entre o fato administrativo e o dano. Significa dizer que ao lesado cabe apenas demonstrar que o prejuízo sofrido se originou da conduta estatal, sem qualquer consideração sobre o dolo ou a culpa.” (páginas 447/448).


O Colendo Superior Tribunal de Justiça analisando o tema em questão também afirmou ser responsabilidade objetiva aquela envolvendo ente estatal em mais de uma oportunidade, como se constata in verbis:


Responsabilidade Civil do Poder Público – Teoria do Risco Administrativo – Exegese. De acordo com o art. 37, § 6°, da CF, as pessoas jurídicas de direito público respondem pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros. Nosso legislador constitucional adotou a teoria do risco administrativo, e por esta não se exige a prova da culpa do agente. São suficientes para caracterizar a sua responsabilidade a prova do dano causado pelo agente público e o nexo causal entre a ação do agente e os danos.” (REsp. n° 38.666-7, 1ª Turma, Rel. Min. Garcia Vieira, v.u., publicada no DUJ de 08/11/1993).


ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANO MORAL PROVOCADO POR FUNCIONÁRIO PÚBLICO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA.
1. A responsabilidade civil que se imputa ao Estado por danos provocados por seus prepostos a terceiros é objetiva, cabendo-lhe indenizar se for verificado o nexo causal entre o evento danoso e o ato do agente (art. 37, § 6º, CF).
2. Recurso especial não-conhecido.” (REsp 798801 – MG, 2ª Turma, Rel. Min. João Otávio Noronha, v.u., j. 21/02/2006, publicado no DJ de 22/03/2006, página 163).


O jurista Caio Mario da Silveira, abordando o tema em comento, ministra com extrema clareza “... que se encarta a teoria do acidente administrativo, ou da falta de impessoal do serviço, em que não se exige a verificação de culpa individual do agente, pois esta nem sempre pode exatamente se positivar ; basta comprovar a existência de uma falha objetiva do serviço público ou em seu funcionamento, ou uma irregularidade qualquer que importe em desvio da normalidade, para que fique estabelecida a obrigação de reparar o dano.” 2


O Desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Humberto Theodoro Júnior, esclarece de forma inquestionável que a responsabilidade objetiva, adotada pela Carta da República, “... dispensa a culpa do agente administrativo, mas condiciona a responsabilidade civil do Estado a alguma falha administrativa e o prejuízo superveniente, sem culpa ou dolo da vítima, cabe a Administração indenizar o lesado ...”


A Ré, portanto, há de sujeitar-se a responsabilidade objetiva e, registre-se desde logo, aqui restou fartamente demonstrado o nexo causal entre os eventos danosos e os atos dos agentes, motivo pelo qual a indenização por danos morais é medida de rigor.

DOS DANOS MORAIS


O Autor teve a sua HONRA abalada face aos impedimentos à sua ascensão profissional, surgidos em virtude da sua passagem à situação de sub-judice, que lhe foi imposta. Este que sempre desfrutou de extrema rigidez disciplinar. Isto fica evidente ao examinarmos suas folhas de alterações e diplomas de concessão de medalhas de tempo de serviço pelos bons serviços prestados ao Exército Brasileiro (documento nº ).


Corrobora ainda tal afirmação, a quantidade de elogios recebidos pelo autor durante toda a sua carreira militar (documento nº ), inclusive tendo sido agraciado com a condecoração da Medalha Militar de Tempo de Serviço – categoria OURO, por mais de 30 (tirinta) anos de bons serviços prestados ao Exército Brasileiro (documento nº ), bem como ____.


Assim, em razão de tudo isto, o constrangimento, a angústia e a ansiedade que lhe foram impingidos nos episódios aqui relatados, considerando que os procedimentos se estenderam por mais de 5 anos, é bem mais acentuada em pessoa cuja personalidade é a do Autor.


O sofrimento que o Autor experimentou naqueles episódios, foi demasiadamente acima do aceitável no meio castrense, especialmente pelo fato de que no instante em que o Autor teve seu nome envolvido em situações que implicam em procedimentos de apuração de crime, de certo, em face de seus superiores, pares subordinados, amigos e familiares, sua imagem foi maculada, seus projetos de vida, embargados.


É praticamente impossível, definir nas frias linhas desta exordial, a dor sentida pelo Autor quando se submetia ao ensaio das palavras que falaria com seus amigos, esposa, oficiais e subordinados, a cada boletim publicado, relacionando os militares promovidos ou movimentados. Sofria, intensamente, a cada ano que era preterido na promoção e movimentação. 


Mais difícil ainda foi ver nos olhos de sua esposa e filhos o medo pressentido e a ansiedade compartilhados, ao cogitar uma possível pré-condenação do pai por corrupção e improbidade, de sorte que todas estas circunstâncias haverão de concorrer para a mensuração dos danos morais que lhes foram impingidos. A ocorrência dos fatos descritos na inicial, portranto, constitui em perda de prestígio e credibilidade do Autor junto aos familiares, amigos, oficiais e subalternos. As pré-condenações geram problemas dos mais sérios na caserna, onde impera a hierarquia. Como fica a situação do Autor perante seus subordinados, pelo fato de enfrentar o estigma de cupado sem sentença condenatória? E perante seus oficiais, com os quais gozava de excelente reputação? Evidente que os familiares, amigos, oficiais e subalternos passam a olhar de forma diferente (e muito). Fatos deste jaez afastam tais pessoas do Autor, prejudicaram promoções entre outros transtornos, passando a ser alvo de comentários negativos, gerando verdadeiro desprestígio no meio (social e militar).


E, tudo isto, em razão de simplesmente negar-se ao Autor o benefício da dúvida, a presunção de inocência, negação inaceitável num Estado Democrático de Direito. O autor em decorrência de sua situação de sub-judice amargurou durante todos esses anos a fama de execrado, de banido, de impedido, ante a impossibilidade de promoção, que, não fosse tal situação, se daria em dezembro de 2006, além do direito, que também lhe foi negado, a pedir transferência para sua cidade original, como se condenado ao desterro perpétuo.


Segundo, Hélio Apoliano Cardoso, Membro do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB-CE e com especialização em Direitos Humanos e Direitos dos Cidadãos pela PUC/MINAS,


por isso, mesmo sob o enfoque tradicional, em ocorrendo o dano, o fato gerador da dor, intranquilidade, sofrimento, angústia, esgotamento emocional, choque psicossomático, desconforto, aborrecimento, depressão, vexame, revolta, preocupação etc, essas sensações de perda e de impotência numa situação, que se afigurava irreversível, obriga a indenização do dano extra-patrimonial perpetrado, mercê de representarem verdadeiro dano moral.
O dano moral corresponde a um prejuízo advindo por sofrimento injusto, mormente quando provocado por ato de publicidade quase que instantâneo. este ato culposo ou não lança o indivíduo na vala dos sem moral, dos que vilipendiam o próprio crédito e retiram a credibilidade de instrumentos criados pela sociedade para tornar a vida mais suave, dentre outras situações constrangedoras. (...) o patrimônio moral, tenho dito, é muito mais importante do que as coisas materiais e se para repará-lo for necessário que o ofensor perca parte de seu patrimônio físico, que o faça, pois esta é a razão de se reparar o dano moral. (…)
Não há negar que as dores, os sentimentos e os sofrimentos pertencem ao maior patrimônio do ser humano, que tem alma, onde as lesões se acentuam com maior intensidade, que varia de pessoa a pessoa, pois cada qual tem maneira imanente e específica de sentir a dor, tanto que o poeta dizia lapidarmente: "se o coração no rosto se estampasse, quanta gente que ri talvez chorasse". ademais, não se pode esquecer jamais que a honra matou mais homens do que a peste, suscitou mais controvérsias do que a misericórdia, mais rixas do que o dinheiro”


Leciona, ainda, yussef cahali, verbis:


"Tudo aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes à sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado, qualifica-se, em linha de princípio, como dano moral: não há como enumerá-los exaustivamente, evidenciando-se na dor, na angústia, no sofrimento, na tristeza pela ausência de um ente querido falecido; no desprestígio, na desconsideração social, no descrédito à reputação, na humilhação pública, no devassamento da privacidade; no desequilíbrio da normalidade psíquica, nos traumatismos emocionais, na depressão ou no desgaste psicológico, nas situações de constrangimento moral." (in ´dano moral´,pp. 20/21, editora revista dos tribunais, 2.ª ed.). a propósito, quem conspira contra a honra, a liberdade, a tranqüilidade de outrem, independentemente de ser grave ou não o ato, não pode ficar isento do compatível pagamento integral da reparativa indenização pelo dano moral perpetrado.”


O Autor, durante todos esses anos em que passou respondendo ao indigitado processo, que na verdade para a administração militar já estava condenado a uma espécie de sanção extrapenal administrativa, porquanto nesse período não pôde ser promovido, movimentado, inscrever-se para cursos militares, ser agraciado com medalhas, etc, sofreu tormentas no seu brio e auto-estima num nível inimaginável, num misto de dor moral, impotência e revolta, ressentido-se diuturnamente com tal situação, vendo os seus direitos de cidadão-militar sendo vilipendiados pela administração militar, que antecipando sanção administrativa, não vislumbrava o seu estado de inocência.


De acordo com o inciso 2, do Art 8º, da Convenção Americana de Direitos Humanos, ratificada pelo Brasil por meio do Decreto nº 678, de 6 nov 1992, verbis:


Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa.”


Sabe-se que, consoante o §3º, do Art 5º da Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional nº 45/2004, “Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.”


A título de ilustração, Celso de Mello, assim se manifesta a esse respeito: 


Mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática de crime hediondo, e até que sobrevenha sentença penal condenatória irrecorrível, não se revela possível - por efeito de insuperável vedação constitucional (CF, art. 5º, LVII) - presumir-lhe a culpabilidade. Ninguém pode ser tratado como culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito, decisão judicial condenatória transitada em julgado. O princípio constitucional da não-culpabilidade, em nosso sistema jurídico, consagra uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados definitivamente por sentença do Poder Judiciário.” (CELSO DE MELLO; Julgamento: 26/06/2001, Segunda turma, DJ 28-09-01, Unânime). 


Outrossim, segundo a Doutora Simone Schreiber, verbis:


O inciso LVII do art. 5o da Constituição Federal de 1988, dispõe que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". Trata-se do princípio da presunção da inocência. (...) Manzini opunha-se assim a Francesco Carrara, o qual partia da premissa de que o processo penal tinha como finalidade própria e específica a proteção dos inocentes frente à atuação punitiva estatal. Sua concepção de processo penal era construída em torno da idéia da presunção de inocência. Nas palavras de Jaime Vegas Torres, Carrara vê tal presunção como "un principio estructurador que extiende su eficacia sobre el proceso penal en su conjunto. Todo el proceso penal se pone al servicio de la presunción de inocencia" [06] 
Com efeito, a consagração do princípio da presunção da inocência na Declaração de 1789 reflete uma nova concepção do processo penal defendida por pensadores iluministas em reação ao sistema persecutório que marcara o antigo regime, no qual a prova dos fatos era produzida através da sujeição do acusado à prisão e tormento, com o fim de extrair dele a confissão. É nessa mudança de foco, em que o processo penal deixa de ser um mero instrumento de realização da pretensão punitiva do Estado, para se transformar em instrumento de tutela da liberdade, que está a chave para se compreender o conteúdo e alcance do princípio da presunção de inocência. (...) no direito processual penal, se ao final o juiz tiver dúvidas a respeito da procedência das alegações do réu, ele deve absolvê-lo ainda que não esteja plenamente convencido daquelas alegações. Em uma palavra, a dúvida não resolvível quanto à matéria de fato é sempre dirimida a favor do réu, independentemente das regras ordinárias de distribuição do ônus da prova. (...) . Mas o princípio da presunção de inocência não se aplica exclusivamente no campo probatório, o in dubio pro reo é apenas uma de suas repercussões. Deve ser dispensado tanto ao investigado quanto ao réu tratamento compatível com seu estado de inocente. A condição de investigado e de réu em processo criminal já traz, por si, indiscutível constrangimento. Em vista disso, todas as medidas restritivas ou coercitivas que se façam necessárias no curso do processo só podem ser aplicadas ao acusado na exata medida de tal necessidade. Se houver várias formas de conduzir a investigação, deve-se adotar a que traga menor constrangimento ao imputado e que enseje a menor restrição possível a seus direitos. (…)


Excelência, a Constituição Federal, promulgada aos 05 de outubro de 1988, prevê de forma expressa o ressarcimento dos danos morais, ou seja, aquelas lesões de interesses não patrimoniais de sujeitos de direito causadas por fatos ou atos lesivos.


Oportuna a lição do saudoso Professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, Carlos Alberto Bittar, in verbis:


"Lembre-se, por fim, que incluída dentre os direitos fundamentais, a norma sobre indenizabilidade do dano moral já se encontra incorporada, ab origine, ao direito vigente." (O Direito Civil Na Constituição de 1988, 1990, pág. 111, Editora Revista dos Tribunais Ltda., São Paulo – SP).


No que tange ao valor da reparação do dano moral mister se faz trazer a colação o ensinamento da insigne Professora Titular de Direito Civil da Faculdade Paulista de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Maria Helena Diniz, in verbis:


"... nada obsta que se dê reparação pecuniária a quem foi lesado nessa zona de valores, a fim de que ele possa atenuar alguns prejuízos irreparáveis que sofreu. Assim, com o dinheiro, o lesado poderia abrandar sua dor, propriciando-se alguma distração ou bem-estar. O dinheiro não aparece, portanto, como a real correspondência equivalente, qualitativa ou quantitativamente, aos bens perdidos pelo lesado. (...) A reparação pecuniária teria, no dano moral, uma função satisfatória ou compensatória e, concomitantemente penal, visto ser encargo suportado por quem causou o dano moral (RTJ, 67:182) (...) A impossibilidade de avaliação do dano moral, hodiernamente, como pontifica Antunes Varela, está quase que superada quer pelos critérios jurisprudenciais adotados para certas modalidades de danos morais, ..." (Curso de Direito Civil Brasileiro, 7º volume, 1984, págs. 75/76, Editora Saraiva, São Paulo – SP).


O Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, YUSSEF SAID CAHALI, escrevendo sobre dano moral, esclarece que não há como enumerá-lo de forma taxativa, eis que se apresenta:


... evidenciando-se na dor, na angústia, no sofrimento, na tristeza pela ausência de um ente querido falecido; no desprestígio, na desconsideração social, no descrédito à reputação, na humilhação pública, no devassamento da privacidade; no desequilíbrio da normalidade psíquica, nos traumatismos emocionais, na depressão ou no desgaste psicológico, nas situações de constrangimento moral.”


A respeito da natureza, intensidade e demonstração do dano moral, oportuna a lição do saudoso jurista Carlos Alberto Bittar in verbis:


Com efeito, o dano moral repercute internamente, ou seja, na esfera íntima, ou no recôndito do espírito, dispensando a experiência humana qualquer exteriorização a título de prova, diante das próprias evidências fáticas. (...) É intuitivo e, portanto, insuscetível de demonstração, para os fins expostos, como se tem sido definido na doutrina e na jurisprudência ora prevalentes, pois se trata de damnum in re ipsa. A simples análise das circunstâncias fáticas é suficiente para a sua percepção, pelo magistrado, no caso concreto. Desse modo, uma vez existente o dano, a perquirição dos fatos acaba, portanto, voltando-se para a conduta lesiva, as posições das partes, o grau de intensidade da violação, elementos esses que influenciam a determinação do quantum no caso concreto, na busca da justiça efetiva.” (in Reparação Civil por Danos Morais, RT, 1993, p. 130).


Merece, também, transcrever o entendimento do ilustre Desembargador bandeirante Rui Stoco, in verbis:


"O dano simplesmente moral, sem repercussão no patrimônio não há como ser provado. Ele existe tão somente pela ofensa, e dela é presumido, sendo o bastante para justificar a indenização." (Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial, 2ª Ed., RT, p. 483, v. 5.17).


Esta foi Excelência, sem dúvida alguma, a situação experimentada pelo Autor em decorrência dos atos praticados pela administração militar. Não se pode perder de vista que a reparação deve ser integral, isto é, a mais completa possível abrangendo os danos morais.


Cumpre salientar que o valor requerido nestes autos, qual seja, o equivalente a ____ salários mínimos por fato, totalizando ____ salários mínimos, que na data de hoje equivale a R$ ____ se traduz em quantia razoável, eis que a indenização deve levar em consideração a pessoa da vítima e, ainda, não deve ficar em patamar ínfimo, sob pena de não inibir a Ré a praticar novamente atos deste jaez.


Ressalte-se, Excelência, que o magistrado ao arbitrar o valor da indenização deve considerar que esta tem por escopo, se não evitar novas ocorrências, pelo menos lembrar ao ofensor que seu patrimônio responderá pelos eventuais abusos, imprimindo de certa forma um caráter educativo.


E, neste sentido, o quantum fixado apresenta-se dentro da mais estrita obediência aos critérios legais estabelecidos pela melhor doutrina.

REQUERIMENTOS FINAIS

Ante o exposto, requer a Vossa Excelência que se digne:

1 - determinar a citação da Ré (através de seu Representante Legal, nos termos do artigo 12, I, do Código de Processo Civil) – por Oficial de Justiça – para, caso queira, apresentar resposta, sujeitando-se em caso de inércia aos efeitos da revelia;

2 - julgar procedentes os pedidos para:

3 - condenar a Ré ao pagamento de morais ao Autor no valor equivalente a 500 (quinhentos) salários mínimos por fato, num total de ____ salários mínimos, que na data de hoje corresponde a R$ ____;

4 - condenar, ainda, a Ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes a serem fixados em sua alíquota máxima.

Provará a veracidade das alegações por todos os meios de prova em Direito admitidos, especialmente pelo depoimento pessoal do Representante Legal da Ré que, com fundamento no artigo 343 e §§ do Código de Processo Civil requer desde já, sob pena de confissão, oitiva das testemunhas, documental, pericial e demais que se fizerem necessárias no curso da instrução.

Requer sejam deferidos ao Sr. Oficial de Justiça os benefícios previstos no artigo 172, § 2º, do Código de Processo Civil.

Requer os benefícios da assistência judiciária gratuita, eis que carentes na forma da lei (documento 11).

Requer que das intimações conste o nome destes subscritores, sob pena de nulidade.

Atribuí-se à causa o valor de R$ ____ .

Termos em que, juntando-se com 11 (onze) documentos, cópia para contra-fé, distribuindo-se, registrando-se, autuando-se pede-se deferimento.

Rio de Janeiro, 28 de setembro de 2011.

Aquila Volatt
Advogado – OAB/RJ

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